18 de janeiro de 2007

Papel de Bala

Esses tempos eu estava andando na rua, um pouco com pressa e levei um susto: tinha um cara com uma bala na mão, estendendo-a para mim.
Posso dizer que alí, naquele momento, conheci um cara mais que legal. Começamos a conversar e ele me surpreendia a cada coisa que fazia, cada coisa que me falava. Era incrível.
Me contou que tinha cinco estômagos e gostava de transar com prostitutas, pois sempre elas lhe juravam amor eternoe ele não tinha amor de ninguém.
Era um homem de coração muito bom, ficava triste com as coisas tristes, como todas as pessoas de coração bom.
Nos sentamos em um banco de uma praça e ele me disse que foi difícil acostumar com a idéia quando seu avô preferido morreu. "Morreu na vespera de ano novo, o velho, e não deixou ninguém em paz."
Aquela bala que ele havia me mostrado antes, ele tinha ganhado do velho avô. Para ele era uma bala muito valiosa - na verdade, cá pra nós, era só uma daquelas freegels de cereja que custam três por dez centavos ou que dão de troco nos supermercados.
Depois de um silêncio chato e sem motivo, ele sacou a bala do bolso novamente, ele ficou alguns minutos olhando pra ela com uma enorme ternura, como se realmente tivesse algum valor.
Descascou a bala apenas com o dedo minguinho e a deu pra uma criança que passava por ali. Olhou de canto pra ver se não vinha mais ninguém - a praça estava um tanto deserta, estava caindo a tarde, frio e uma chuva fina começava a cair - então ele engoliu o papel e o deixou reservado no seu quinto estômago como se fosse uma lembrança do avô.
Às vezes, quando sente um aperto no coração, ele "vomita" o papel e fica lembrando dos velhos momentos com o velho que lhe faz tanta falta quanto o amor.

2 comentários:

Anônimo disse...

Melu, suas palavras são belas demais para jogá-las no lixo!

ps; Quem vê papel de bala não sente o sabor.

Duda Furio disse...

tenho uma pedra costurada num cadelinha de pelucia, ganhei do meu pai e ela vai virar pingente...
o poder do simbolismo, movimenta multidoes!